terça-feira, 29 de novembro de 2016

Krishna e Cristo


Vishnu, de acordo com as mais antigas fontes, apareceu sob a forma de homem em 4 000 a.C. à virgem Devanaki (= mulher criada para Deus) que pertencia à casa real. Devanaki caiu em êxtase, ofuscada pelo espírito de Deus, que uniu-se a ela em divino e majestoso esplendor. Devanaki concebeu uma criança. Uma profecia no Atharva-Veda narra o acontecimento da seguinte forma: "Bendita és tu, Devanaki, entre todas as mulheres, e bem-vinda seja entre os sagrados Rishis. Fostes escolhida para a obra da salvação... Ele virá com uma coroa de luz e o céu e a terra se encherão de júbilo... Virgem e mãe, nós te saudamos, como a mãe de todos nós, pois dará a luz ao nosso salvador, a quem darás o nome de Krishna". No Bhagavad-Gita, o rei de Mathura foi avisado, em um pesadelo, de que a filha de sua irmã, Lakshimi, teria um filho que seria mais poderoso que o próprio rei. A virgem Devanaki e seu filho recém-nascido esconderam-se no campo em companhia de alguns pastores, escapando milagrosamente aos soldados a quem o rei havia ordenado matar todos os recém-nascidos do sexo masculino. O Atharva-Veda conta esta mesma história de modo diferente. O rei Kansa de Mathura viu uma estrela cadente e consultou um brâmane sobre seu significado. O sábio homem disse que o mundo havia se tornado cruel, e que Deus se compadecera do homem, dominado pela cobiça e pelo pecado, enviando à terra um salvador. A estrela era Vishnu, encarnado no ventre de sua sobrinha, Devanaki, que, um dia, desagravaria a humanidade de todos os seus crimes, guiando-a por novos caminhos. Enraivecido, o rei ordenou a morte do brâmane e de todos os meninos recém-nascidos. Existem muitas versões sobre a juventude de Vishnu e muitos poemas exaltando suas qualidades e poderes. Assim como o menino Jesus nos evangelhos apócrifos, o menino Krishna realizava todo tipo de milagres. Foi assim que ele conseguiu sobreviver à armadilha que seu tio Kansa lhe preparou. Em uma ocasião, uma serpente esgueirou-se para dentro de seu leito, a fim de estrangulá-lo, mas foi morta pelas próprias mãos do menino (cf. o mito do jovem Hércules). Mais tarde, Krishna venceu a serpente de muitas cabeças, Kalia, e obrigou-a a deixar o rio Yamu-na. Os atos heróicos desse extraordinário menino indiano encheriam volumes inteiros. Com 16 anos, deixou a companhia da mãe para divulgar sua doutrina por toda a índia. Condenava a corrupção do povo e dos príncipes e dizia ter vindo ao mundo para redimir o homem do pecado original, para exorcizar os espíritos imundos e restaurar o reino do bem. Superou tremendas dificuldades, lutou, sozinho, contra exércitos inteiros, realizou toda a sorte de milagres, ressuscitou os mortos, curou leprosos e aleijados, restituiu a visão aos cegos e a audição aos surdos. Rodeou-se, finalmente, de discípulos que cuidaram dele com o maior desvelo e que deveriam continuar sua obra. De toda parte acorria gente para ouvi-lo e admirar seus milagres. Era reverenciado como a um Deus e reconhecido como o verdadeiro redentor, prometido pelos profetas. De tempo em tempo, afastava-se do seu grupo, deixando seus discípulos a sós, para testá-los, e regressava somente nos momentos de dificuldades. O alastramento do movimento desagradou os detentores do poder que, em vão, tentaram reprimi-lo. Krishna, como Cristo, não desejava propagar uma nova religião, mas simplesmente renovar a já existente, libertando-a de seus odiosos abusos e impurezas. Seus ensinamentos, como aqueles de Jesus, apresentavam-se sob a forma de aforismos e parábolas poéticas. Tudo que disse foi registrado no Bhagavad-Gita, que expõe, de maneira clara, a moralidade pura das elevadas concepções de Krishna. Ele exige de seus discípulos o amor ao próximo, a dignidade, o auxílio aos pobres, a prática de boas ações e a fé na infalível misericórdia do Criador. Manda pagar o mal com o bem, amar os inimigos e proíbe a vingança. Ele consola os fracos, condena a tirania e auxilia os desafortunados. Vive na pobreza e dedica-se aos desamparados e oprimidos. Não tem vínculos pessoais e defende a castidade. Como Jesus, Krishna leva uma vida de peregrino mendicante. Krishna também passa por transformações. O filho de Deus se manifesta a Arjuna, um de seus discípulos favoritos, sob muitas formas divinas, dizendo-lhe: "Quem fizer algo por minha causa, quem se devotar inteiramente a mim, quem se libertar do mundo da matéria e do ódio aos seres, virá a mim" (Bhagavad-Gita, décimo-primeiro canto). A lenda de Krishna, provavelmente, constitui a mais remota fonte ligada à figura mística de Jesus. Semelhanças com as lendas de Dionísio (aprox. séc. 7 a.C.) são igualmente surpreendentes. Não foram, porém, somente as grandes culturas da Grécia e de Roma que influenciaram o cristianismo. O antigo Irã, com suas figuras de salvadores e visões escatológicas e apocalípticas, também exerceu uma grande influência sobre a religião cristã. As figuras de maior destaque na religião persa foram Zaratustra e Mitras, homens-deuses que reformularam as rígidas tradições religiosas. Antes de Zaratustra, a concepção religiosa do Irã oriental era praticamente idêntica àquela da antiga índia.

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